UM HISTORIADOR COM O PÉ NO REAL E
NÃO NA UTOPIA
Luciano Trigo
Sobre a História e outros ensaios
, de Michael Oakeshott. Tradução de Renato Rezende
Publicado em 1983, “Sobre a História” reúne cinco
ensaios que abordam temas centrais da ciência política, como a natureza
da História, o primado da lei e a luta pelo poder inerente à condição
humana. Para Michael Oakeshott, o esforço do historiador deve ser
entender o passado sem pensar na busca de soluções para o presente.
Surpreendente para quem espera de um filósofo político a afirmação
de algum princípio racional, como a liberdade, a justiça ou a igualdade,
a tese do historiador inglês, de que devemos nos preocupar com o
que realmente acontece no mundo, e não com o que deveria ser feito,
aparece em todo os seus livros.
A original abordagem histórica de Oakeshott (1901-1990)
foi forjada pela leitura de Sócrates, Santo Agostinho, Montaigne
e Hobbes, mas ele não entendia os clássicos como repositórios de
conhecimentos e lições de uso prático, e sim como introduções a
modos de pensar. Como professor universitário, evitava a defesa
de posições políticas, bem como qualquer análise moralizante da
História ou uso ideológico da filosofia. Para Oakeshott, a História
é um modo de interpretação do mundo que não deve aspirar a lições
ou recomendações relativas a questões políticas. Atribuir à História
uma responsabilidade moral seria um erro, como já comprovaram tanto
a evocação à Providência dos religiosos quanto os imperativos dialéticos
dos marxistas.
Oakeshott afirma que a História, mesmo não conduzindo
a conclusões práticas, serve para iluminar o presente, na medida
em que este é uma combinação de resíduos do passado: quando um historiador
olha uma paisagem, afirma, seus olhos devem se fixar nas suas ruínas,
e não nas suas potencialidades. Outra idéia do autor é a de que
não devemos reduzir todos os modos de conhecimento a um sistema
globalizante. Para ele, a filosofia e a História, assim como a ciência
e a matemática, constituem “linguagens, mais que literaturas” ou
seja, são modos de interpretar o mundo. É a partir do diálogo autêntico
entre essas linguagens que se realiza a autêntica liberdade. Já
a política, a poesia e a moral seriam tipos diferentes de linguagem,
que servem para expressar opiniões, crenças, ideais e estratégias
de vida.
Caderno Prosa & Verso
O GLOBO
Rio de Janeiro
01/11/2003
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