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Nêumanne entrevista José Murilo de Carvalho

Polarização afasta País do rumo de crescer e compartilhar riqueza, diz historiador
Para José Murilo de Carvalho, radicalização difundida pelas redes sociais leva a grande maioria dos brasileiros a tomar posição

O historiador José Murilo de Carvalho acha que “o Brasil já passou por momentos de polarização política que levaram a revoltas, guerras civis e golpes, como durante as décadas de 1890, 1930 e 1950. Hoje, embora a polarização seja mais verbal, ela é muito mais difundida, graças às redes sociais. Pode-se dizer que a grande maioria dos brasileiros tomou posição.  Não vivemos mais em tempos de revoluções, mas a polarização estéril afasta o País do único rumo que deveria tomar: crescer e compartilhar a riqueza”.

Personagem da série Nêumanne Entrevista desta semana, o acadêmico mineiro assegura que “não se pode negar a legitimidade do mandato do capitão reformado. Mas será um duro teste para nossas instituições conter seus impulsos autoritários e, sobretudo, os riscos que correm em seu governo áreas fundamentais como as relações exteriores, a educação e o meio ambiente”. Autor de uma celebrada biografia de dom Pedro II, ele acredita que o imperador ensinaria o presidente “a respeitar as leis, garantir as liberdades, promover a educação e a cultura e se guiar pelo interesse público, como bom republicano que era”.

Nascido em 8 de setembro de 1939 em  Piedade do Rio Grande, José Murilo de Carvalho saiu do interior de Minas para iniciar seus estudos na capital. Em 1965 formou-se em Sociologia e Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a seguir foi para  os Estados Unidos cursar mestrado e  doutorado em Ciência Política na Universidade Stanford, na Califórnia. No mesmo lugar fez seu primeiro pós-doutorado, sendo o primeiro curso especificamente na área de História. É professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor honoris causa da Universidade de Coimbra.

José Murilo atuou profissionalmente em várias universidades, como UFMG, Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro, Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade de Londres,Universidade da Califórnia, Universidade de Leiden (Holanda), Universidade de Notre Dame (EUA) e Universidade Stanford. Foi ainda pesquisador na  Fundação Casa de Rui Barbosa, na Fundação Getúlio Vargas, no Institute for Advanced Study (EUA), na Maison des Sciences de l’Homme e no Centre d’Étude des Mouvements Sociaux (França).

É vasta sua produção científica, que gira em torno  das  questões de nação, cidadania, justiça e liberdade político-social. Entre os diversos livros e artigos publicados pelo historiador destacam-se as obras A formação das almas (1990), na qual aborda o impacto da República na formação do imaginário popular, lançando mão, além das fontes tradicionais, de um vasto material cultural, como imagens plásticas, música, literatura e charges, e  A cidadania no Brasil (2001), onde traça um longo percurso de como se deu a construção da cidadania no País.

O primeiro livro rendeu-lhe os Prêmios Jabuti e Banorte de Cultura Brasileira, ambos em 1991. E com o segundo recebeu o Prêmio Casa de las Américas. Além desses, ganhou o prêmio de Melhor Livro de Ciências Sociais, em 1987, pela obra Os bestializados (1987), e o Prêmio Jabuti por D. Pedro II, ser ou não ser. Entre diversos outros prêmios, destacam-se também as medalhas de oficial (1989) e comendador da Ordem do Rio Branco (1991), ofertadas pelo Itamaraty, e o Prêmio Almirante Álvaro Alberto, do CNPq.

José Murilo de Carvalho, Celso Lafer e Edmar Bacha são os únicos brasileiros a fazer parte da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Ciências ao mesmo tempo. O historiador foi eleito para a  cadeira de Rachel de Queiroz na Academia Brasileira de Letras em 10 de setembro de 2004. Pode ser considerado um dos pensadores do Brasil.

Nêumanne – Em 8 de setembro próximo o senhor vai completar 80 anos. De tudo o que viveu nesse quase século de existência, o que mais o alegrou, o que mais o comoveu e o que mais lamentou ter visto, chegando talvez ao ponto de lastimar haver passado por aquilo?

 José Murilo - Restringindo-me ao domínio da vida pública e profissional, o que mais me alegrou foi a eleição para a Academia Brasileira de Letras. O que mais me comoveu foi a cerimônia de entrega do título de Professor Emérito da Universidade de Coimbra. E o que mais lastimei foi o golpe de 1964, que matou sonhos de uma geração. 

N – Que sonhos de sua infância em Piedade do Rio Grande, no interior das Alterosas, o senhor conseguiu realizar e que objetivos ainda persegue para os anos que seus leitores e admiradores esperam que sejam numerosos e bem aproveitados? Quais são as suas impressões mais fortes da homenagem de que foi alvo na Festa Literária Internacional de Paraty neste mês de julho?

 JM – Tudo muito pedestre. Meu sonho de criança na fazenda de Santa Cruz era tornar-me um fazendeiro com muitas vacas no curral. O destino dispôs de outro modo e tornei-me um fazendeiro do ar, embora muito menor do que  Drummond. Não há mais muita estrada pela frente e me entristece   o rumo de nosso país. Receio perdermos nosso futuro. Quanto à Flip, a primeira de que participei, agradeço a delicadeza do convite feito por Fernanda Diamond e a generosa acolhida do público que me ouviu.

N – Que lições o senhor aprendeu e tem a transmitir ao leitor quanto às  mudanças ocorridas nas relações das Forças Armadas com a República, nascida sob a égide delas, e que levaram o mercado editorial a perder o interesse pela reedição de seu livro de ensaios intitulado Forças Armadas e política no Brasil após edição e reedição pela Zahar há 14 anos, e agora o levaram a acrescentar textos atuais e reeditá-lo pela Todavia?

JM – A História nos prega peças, sobretudo no Brasil. Quando muitos achávamos que o problema do envolvimento político das Forças Armadas estava resolvido, ele reaparece, embora de forma mais benigna do que em 1964. Daí o interesse da Todavia por uma reedição do livro com um capítulo de atualização. Não há Forças Armadas democráticas, mas há Forças Armadas profissionais, que se submetem ao governo civil. Desde a proclamação da República pelo Exército, nossas Constituições têm admitido um papel político para as Forças Armadas. Só a consolidação das instituições do governo civil garantirá a profissionalização delas. 

N – Desde a queda da ditadura militar até o ano passado, os políticos civis que comandaram a República imaginaram que poderiam deixar os soldados esquecidos em suas casernas enquanto cuidavam das instituições e dos negócios republicanos, mas, nesse tempo todo, permaneceu no imaginário popular uma certa visão respeitosa e até nostálgica de tutela deles. Por que essa impressão ganhou tanta força a ponto de alimentar ilusões de intervenção fardada para combater vícios como a corrupção e defeitos das instituições da democracia representativa, e a eleição do capitão reformado e ex-deputado Jair Bolsonaro pelo voto popular majoritário?

JM – Há avaliações distintas das Forças Armadas pela população. Camadas mais educadas, que sofreram o maior peso da repressão durante a ditadura, têm visão negativa delas.  O povão tem imagem mais positiva e, como mostram as pesquisas de opinião pública, consideram mesmo as Forças Armadas mais confiáveis do que instituições civis. Os malfeitos dos governos e dos políticos em geral, aliados à crise econômica, geraram as ondas em que surfou o capitão reformado.

N – Que diferenças há entre as convicções dos chefes militares da questão militar no Império, dos positivistas que conduziram os anos iniciais depois do golpe de 1889, dos tenentes de Forte de Copacabana, da coluna de Miguel Costa e Prestes, da geração da ESG que inspirou o discurso do coronel Bizarria Mamede no sepultamento do general Canrobert Pereira da Costa, do golpe fracassado de 1961 e do vitorioso de 1964 e as dos generais que despacham no palácio do capitão que preferiu virar político a fazer o curso de Estado-Maior? Esse militarismo subordinado a patentes pelo avesso veio de quê e pode levar a que rumo, a seu ver?

JM – Será necessário escrever mais um livro para responder a essas perguntas. A atuação política conservadora das Forças Armadas brasileiras data da década de 1930, quando elas se transformaram em ator político de peso. A ditadura acabou tendo um alto custo para sua imagem. Após 1985 houve um esforço de profissionalização, especialmente na Marinha e na Aeronáutica. O envolvimento de oficiais-generais do Exército no governo do capitão reformado é uma operação de risco. Não caracteriza um governo militar, mas pode ser um tiro que sai pela culatra.  

N – Como o senhor tem acompanhado a implantação dessa dita “nova política”, que renega princípios condenados pela “velha”, como o nepotismo, levado a extremo no caso da tentativa do presidente de nomear o filho embaixador em Washington, afrontando a diplomacia do barão do Rio Branco, numa espécie de renovação pelo voluntarismo do chefe messiânico? E, por falar no Paranhos moço, que lições o senhor, como autor da excelente biografia de dom Pedro II, acha que aquele sábio e judicioso imperador tem a dar ao atual presidente, que muitas vezes age como se tivesse sido eleito para exercer o monopólio da verdade?

JM – Como todos os democratas, vejo nuvens pela frente. Não se pode negar a legitimidade do mandato do capitão reformado. Mas será um duro teste para nossas instituições conter seus impulsos autoritários e, sobretudo, os riscos que correm em seu governo áreas fundamentais como as relações exteriores, a educação e o meio ambiente. Dom Pedro lhe ensinaria a respeitar as leis, garantir as liberdades, promover a educação e a cultura e se guiar pelo interesse público, como bom republicano que era.

N – Existe alguma explicação na História do Brasil para a exacerbação a que chegou a guerra ideológica, iniciada no Estado petista com seus aliados da política tradicional e tornada mais ferrenha no antipetismo como arma eleitoral, adotando uma espécie de “capitanismo”, que supera o coronelismo da Velha República. pelo menos na adoção de critérios de familismo e fanatismo ideológico?

JM –  O Brasil já passou por momentos de polarização política que levaram a revoltas, guerras civis e golpes, como durante as décadas de 1890, 1930 e 1950. Hoje, embora a polarização seja mais verbal, ela é muito mais difundida, graças às redes sociais. Pode-se dizer que a grande maioria dos brasileiros tomou posição.   Não vivemos mais em tempos de revoluções, mas a polarização estéril afasta o País do único rumo que deveria tomar: crescer e compartilhar a riqueza.

N – Como tesoureiro da Academia Brasileira de Letras, o que o senhor acha da atual crise da educação e da cultura, atingidas pela violência da guerra ideológica atualmente travada no Brasil?

JM  – Como tesoureiro, preocupo-me com as finanças da casa, afetadas pela crise financeira.   Como membro de uma Academia de Letras (e também de uma Academia de Ciências), a preocupação é com o obscurantismo que tem infectado áreas do governo exatamente nas de educação, cultura e ciências.

N – Como o senhor percebe e explica a invasão dos bárbaros que, em pleno século da tecnologia avançada, contestam Galileu, os navegadores de Sagres, Darwin, Einstein e até o uso civilizatório da vacina de Fleming e Sabin? O senhor se surpreende com as dúvidas renitentes sobre o desembarque da nave tripulada na Lua, as convicções sobre a Terra plana e a volta de graves enfermidades transmissíveis com a contestação e até a demonização das vacinas, numa espécie de execração a Oswaldo Cruz?

JM – Embora não exclusivamente brasileiro, o fenômeno é difícil de explicar. Minha hipótese é que o aferrar-se ao passado e às tradições em geral é fruto do medo e da insegurança trazidos pelas mudanças tecnológicas, sociais e culturais que se processam de maneira cada vez mais rápida. São reações parecidas com as dos luditas que no século 19 quebravam as máquinas que lhes ameaçavam o emprego. As mudanças de hoje são ainda mais assustadoras.

N – Nesses nossos tempos de ideologia de gênero, que papel pode exercer a saga da segunda-sargenta cearense que cerrou fileiras com as tropas da Tríplice Aliança na Guerra do Paraguai, para a qual o senhor chamou atenção no livro, lançado pela editora Chão, com o belíssimo título Jovita Alves Feitosa, Voluntária da Pátria, Voluntária da Morte?

JM  – Jovita era uma sertaneja cearense de 17 anos que se voluntariou para ir à guerra.  Não foi, mas se distinguiu por uma postura feminista muito avant la lettre. Seu propósito ao se apresentar era matar paraguaios para se vingar das brutalidades cometidas por eles contra mulheres brasileiras em Mato Grosso. Deixou claro que para fazer trabalho de  mulher ficaria em casa.  Não por acaso, sua memória foi  apropriada pelo movimento feminista.
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