ESCRITOS POLÍTICOS
A segunda metade do século XVIII produziu
um conjunto notável de pensadores cuja influência no
desenvolvimento das sociedades e das instituições
livres é incalculável, destacando-se entre eles Bernard
Mandeville, Adam Smith, David Hume e Edmund Burke. Mas é
significativo que um período do pensamento marcado por tantos
nomes poderosos tenha ficado conhecido como a "era de Johnson".
Publicado pela primeira vez no Brasil, em parceria da Topbooks com
o Liberty Fund, Escritos políticos ajuda a entender por que
a obra de Samuel Johnson (1709-1784) permanece tão importante
até os dias de hoje.
A reputação literária do
Dr. Johnson não se deve apenas aos ensaios de cunho político.
Poeta de talento, crítico, biógrafo, lexicógrafo,
autor de sermões, diários e narrativas de viagens,
além de editor (das peças de Shakespeare, em oito
volumes, em 1765, e do famoso Dicionário da Língua
Inglesa, que consumiu 10 anos de trabalho até ser publicado
em 1755), ele foi também – graças a seu bom
amigo James Boswell – tema da mais famosa biografia já
escrita: Vida de Samuel Johnson (1791). Entre suas obras
destacam-se, ainda, A vida dos poetas, uma série feita
entre 1779 e 1781; o relato Uma viagem às ilhas ocidentais
da Escócia, que visitou em companhia de Boswell, em 1773;
a tragédia Irene e a novela Rasselas, uma fábula
oriental, realizada para pagar o funeral de sua mãe.
Escritos políticos reúne
24 ensaios de Johnson sobre as principais questões sociais,
econômicas e políticas de seu tempo, incluindo os panfletos
“O alarme falso”, “Reflexões sobre a coroação”
e “O patriota” – um dos mais célebres do
autor, produzido durante a Revolução Americana. São
textos que desmentem a tese, sugerida por Boswell, de que Johnson
era avesso à política; na verdade, seu interesse nas
questões públicas é uma extensão de
sua preocupação com a moralidade privada. Sua argumentação
quando discorre sobre a Revolução Americana é
exemplar: ele ataca a hipocrisia com que os revolucionários
evocam leis universais, divinas e naturais ao reclamarem a liberdade
que negam a seus escravos negros.
Para entender o pensamento político de
Johnson é preciso levar em conta a tradição
do conservadorismo cético à qual ele se filia, e que
se caracteriza essencialmente pela descrença em grandes dogmas
ou sistemas teóricos abrangentes que possam ser tomados como
base para a ação política. Vale frisar também
que o ambiente em que viveu foi de mudança de ideais literários:
o classicismo e o conservadorismo representavam uma reação
ao culto dos sentimentos, anunciado pelos precursores do romantismo.
Por fim, deve-se ter em mente que é inadequado aplicar ao
pensamento de Johnson, bem como às atitudes e ao contexto
social e político da Inglaterra do século XVIII, categorias
como “esquerda” e “direita”, pecado cometido
por muitos de seus comentadores, a começar por Macaulay.
Como afirma Donald Greene na Introdução
a este livro, se é certo que Johnson se dedicou bastante
a questões políticas, por outro lado é difícil
classificar politicamente suas ideias: seus estudos são pragmáticos,
não se prendendo a qualquer ilusão idealista ou romântica,
embora ele defenda a ação política como ferramenta
para desenvolver a condição humana e combater abusos
e injustiças. As dicotomias habituais nas análises
da história política inglesa – “Whig
versus Tory”, “progressistas versus reacionários”
– não se aplicam aqui. De qualquer modo, há
uma questão subliminar em todos os seus ensaios: de que forma
se pode tornar agradável, e não apenas suportável,
a vida de cada indivíduo na sociedade? Eis aqui uma reflexão
que seculariza a política.
Filho de um livreiro, Samuel Johnson nasceu em
Lichtfield em 18 de setembro de 1709. Aos 19 anos foi enviado ao
Pembroke College, em Oxford, mas teve que abandonar a instituição,
um ano depois, por falta de recursos financeiros. Aos 27, partiu
para Londres na companhia de seu pupilo, David Garrick, decidido
a tornar-se escritor. Nos 10 anos seguintes, escreveu, por dinheiro,
pequenas biografias, sátiras políticas, reportagens
e poemas, entre os quais o consagrado The vanity of human wishes,
de 1749. Por quase três décadas viveu exclusivamente
de sua pena, tornando-se celebridade nacional. De constituição
larga e forte, tinha problemas de visão e audição
e apresentava tiques e movimentos involuntários, o que levou
seus contemporâneos a sugerir que sofresse de síndrome
de Tourette, ou de desordem obsessivo-compulsiva. Anglicano conservador
e devotado, com forte tendência à melancolia, foi homem
compassivo, que sustentou grande número de amigos sob seu
teto.
Na época em que chegou a Londres, a cidade
estava atravessando uma das crises mais turbulentas de sua história,
e que duraria ainda muitos anos, até a queda de Robert Walpole
em 1742. O jovem logo se envolveu nos debates que dividiam a população,
participando ativamente da campanha contra Walpole, o que lhe deu
oportunidade de colocar em prática, e refinar, seus recursos
retóricos. Nos anos seguintes, Johnson se dedicou à
feitura do Dicionário, mas a política voltou
a ocupá-lo quando os conflitos entre França e Inglaterra
culminaram na Guerra dos Sete Anos, entre 1756 e 1763. Dessa vez,
se opôs firmemente à política externa inglesa,
que, em nome do patriotismo, era belicista, expansionista e francofóbica.
O presente volume reúne uma seleta de
seus ensaios políticos, mas é importante lembrar que,
além dos textos compilados por Donald Greene, ele também
escreveu na Gentleman’s Magazine, entre 1739 e 1744,
artigos sobre os debates mais polêmicos do parlamento britânico.
Como era proibida a transcrição desses debates na
imprensa, os nomes de políticos, como Walpole e Pitt, ele
substituiu por anagramas (Walepop e Ptit) em seus relatos sobre
o “fictício” Senado de Lilliput – referência
ao escritor satírico Jonathan Swift. O famoso Dr. Johnson,
como ficou conhecido internacionalmente, voltaria a escrever com
regularidade na imprensa: entre 1750 e 1752 no periódico
The Rambler e, mais tarde, em The Adventurer e The
Idler.
OPINIÕES SOBRE O AUTOR:
Nenhum conjunto de documentos revela melhor as predileções
de Samuel Johnson como ensaísta – a tranquilidade,
a rapidez e a maestria com que ele trabalhava no gênero –
do que os reunidos em Escritos políticos. Os ensaios
cobrem quase toda a carreira de Johnson. Indicam sua devoção
ao gênero, sua amplitude mesmo no estreito campo do tema,
e os fortes princípios morais e preocupações
didáticas que regem sua escrita.
Robert Donald Spector
O Johnson (…) político era um satirista
vigoroso da oposição e o jornalista mais capaz de
seu tempo.
Robert Folkenflik
Como seu verdadeiro precursor, quem quer que
tenha escrito o Eclesiastes na Bíblia hebraica, Johnson é
perturbador e inconvencional, um moralista completamente idiossincrático.
É para a Inglaterra o mesmo que Emerson para os Estados Unidos,
Goethe para a Alemanha e Montaigne para a França: o sábio
nacional.
Harold Bloom
Johnson colocava muito de si no que escrevia,
e isso vale mesmo para seus textos políticos, que são
hoje normalmente condenados sem serem lidos. Eles nos permitem medir
sua reação a alguns dos mais importantes acontecimentos
de sua época, e também vislumbrar algumas de suas
convicções mais apreciadas.
John P. Hardy
Na metade do século XVIII, Samuel Johnson
era o protótipo do escritor profissional, que vivia de sua
pena e não do mecenato, e exultava com sua função
de satisfazer a demanda do mercado literário.
Robert Darnton
Johnson oferece uma sabedoria política
que não se restringe ao gênero do trato político,
abarcando questões que nossa experiência diária
da moralidade das perspectivas nacional e internacional deixa sem
solução.
Philip Smallwood
|