A HISTÓRIA VIVIDA
“Deve-se assinalar
que esta é uma grande contribuição histórica,
captada na hora da criação ou logo após sua
geração. E feita com os instrumentos da história
oral, entrevista gravada, com suas imperfeições de
linguagem e construção e sua genuinidade e credibilidade.
(...) Deve-se acentuar a inteligência do coordenador e de
seus colaboradores, que souberam formular tão bem as perguntas,
levantar problemas, criar situações cheias de perplexidade
para os entrevistados, apontar suas contradições;
enfim, os que colheram e ordenaram os materiais para este livro
são partes essenciais dele (...).
A História vivida representa
um desenvolvimento muito significativo da historiografia instantânea,
pois reúne depoimentos vivos de personalidades que fizeram
História, quer pela ação, quer pela influência
de seu pensamento. É absorvente pelo interesse em se ler
o que pensam personalidades de relevo na política; é
rico pela acumulação de detalhes; é impressionante
pela franqueza dos depoimentos; é ambicioso na largueza de
seu interrogatório, na objetividade e subjetividade das respostas,
e vai mudar muitas versões históricas ainda em debate.
A coordenação de Lourenço Dantas Mota e o papel
de seus colaboradores destacam-se pela viva inteligência e
perspicácia na seleção das questões
levantadas”.
José Honório Rodrigues
A propósito do 1º volume da edição original
(1981)
O coordenador Lourenço Dantas Mota quis
apresentar um retrato do Brasil (...), ouvindo alguns dos prógonos
do processo histórico, pessoas que marcaram com sua ação
pública ou obra escrita o panorama nacional, imprimindo-lhe
normas. Escolheu nomes e formou grupos de dois a quatro entrevistadores
para cada um. Os componentes do grupo estudaram a ação
do personagem, o ambiente que enfrentou, aliados e inimigos, de
modo a irem bem armados para a reportagem, com a formulação
de perguntas que se impunham. Resultou daí uma série
de depoimentos de importância histórica, fundamentais
para a compreensão de nossa época. (...) Tem-se aí
uma série de informações, às vezes desconhecidas,
dadas por pessoas de destacado papel na vida nacional, no governo,
na liderança política, na economia, nas finanças,
nas letras, nas artes em geral, na educação, nas armas,
no movimento sindical. A leitura é fascinante, pois se tem
não só a linha de desenvolvimento do país como
a História factual (totalmente negada por autores preocupados
com interpretação, esquecidos de que se interpreta
algo verificado: só quem conhece o factual pode menosprezá-lo),
além da confissão dos motivos pessoais que levaram
a uma atitude, os pequenos incidentes formadores da teia do decisivo.
Chega-se ao geral e particular, ao social e individual, ao subjetivo
e objetivo. Em certas entrevistas há toda uma trajetória
humana, no esboço de um perfil psicológico e de uma
biografia dignos de interesse. Como fonte para a História,
a presente obra é inestimável: será lida com
paixão no presente, como no futuro, quando vai servir de
base para a reconstituição da vida de agora.
De fato, o que há de significativo em
nossos dias aí está: a denúncia dos vícios
da República Velha e o protesto contra o quadro, na crítica
e na ação armada dos tenentistas, culminando em 1930;
as lutas ideológicas, com o conservadorismo comum dos grupos
dominantes e o surgimento da esquerda (no extremo o Partido Comunista)
e da direita (no extremo o integralismo); os episódios de
1935 e 38; o Estado Novo; a sua queda e os governos Dutra, Vargas,
JK, Jânio Quadros, João Goulart e o movimento de 31
de março de 64, indevidamente rotulado Revolução;
a série de chefes militares. Os episódios e figuras,
vencedores e vencidos são lembrados e julgados em várias
passagens. Os planos econômicos e a forma de crescimento ou
desenvolvimento econômico são considerados (...).
O critério do organizador levou a uma
escolha feliz de nomes, gente que tinha muito para contar e capacidade
para analisar, pelos cargos ocupados, pela trajetória pessoal.
Os repórteres sabiam propor questões, pelo estudo
do trabalho de cada um. O resultado é documento altamente
informativo, valiosa fonte histórica. Hoje, quando se multiplicam
as memórias de escritores e políticos, bem como os
livros de reportagens sobre episódios ou protagonistas -
há vários outros do gênero, em geral com escritores
-, temos o testemunho de muitos. Com eles é possível
o melhor entendimento do agora e a reconstituição
segura no futuro, pois dão a base para a História
a ser escrita. Felizes os pesquisadores de então: podem ouvir
dos próprios personagens a versão do processo tal
como se deu. A História vivida é o melhor exemplo
de que toda História é combatente, engajada no seu
tempo: vive-o e procura transformá-lo, melhorando-o, na crítica
e no ataque aos repressores, no estímulo à luta pela
liberdade e pela afirmação do homem, criativo e soberano,
num mundo de iguais e reconhecedor dos direitos.
Francisco Iglesias (1981)
Não nos enganemos: as entrevistas coordenadas
por Lourenço Dantas Mota com personalidades da vida brasileira
nos últimos 40 anos (...) serão daqui por diante uma
das nossas fontes historiográficas mais importantes e esclarecedoras.
Não apenas pelo que os entrevistados disseram, isto é,
por suas opiniões pessoais, posições ideológicas
e inevitável viés subjetivo em que cada um deles deseja
conformar a sua imagem; eu diria, mesmo, que, sendo característica
e indispensável para o conhecimento dos homens e dos fatos
de nossa vida como nação, não só no
período com eles diretamente relacionado, mas no que se refere
à nossa maneira de ser e de agir, essa é a parte,
se não secundária, pelo menos subsidiária da
questão. De fato, tratando-se de episódios, conjunturas
e formas de pensamento que se podem ter como suficientemente esclarecidos,
o conhecimento, no caso, será menos essencial do que
a compreensão - e o que esse livro nos permite é
compreender o Brasil, perceber onde estão as falhas do tecido
nacional e as partes fortes de sua trama; numa palavra: em que consiste,
afinal de contas, ser brasileiro.
Wilson Martins (1982)
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